Pesquisadores do Centro de Valorização de Compostos Bioativos da Amazônia realizam análises físico-químicas no laboratório da UFPA instalado no PCT Guamá
Viscoso, doce e com um leve toque de acidez. Essas costumam ser as características esperadas em um mel, mas nem sempre a presença ou a ausência de uma delas indica um produto de boa qualidade. Seja por uma possível adulteração ou pela espécie de abelha que o produziu.
Para atestar a qualidade do mel regional, pesquisadores do Centro de Valorização de Compostos Bioativos da Amazônia (CVACBA) realizam uma bateria de análises físico-químicas no laboratório da Universidade Federal do Pará (UFPA) instalado no Parque de Ciência e Tecnologia (PCT) Guamá, em Belém.
Os estudiosos explicam que o mel resulta de uma perfeita simbiose entre o reino vegetal e o animal. Em geral, explicam eles, as abelhas coletam o néctar floral das plantas e as processam a partir de enzimas digestivas contidas em seus organismos. Dessa forma, os sabores e as propriedades dos méis variam de acordo com a matéria-prima colhida e com as características dos organismos das diferentes espécies de abelhas.
“Apesar de o mel ser um produto completamente natural, existe muita adulteração no mercado. Por exemplo, quando está in natura, novo e ‘verde’, ele é mais fluido. Então para dar aquela viscosidade característica, algumas pessoas fervem para tentar desumidificar. Quando se faz isso, além de perder água, pode perder também parte das propriedades fenólicas e sensoriais naturais do mel”, explica o pesquisador Nilton Muto, um dos cientistas do CVACBA/UFPA.
Através das análises, é possível assegurar a qualidade de acordo com os parâmetros da Instrução Normativa (IN) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) que rege a comercialização do mel. Porém, segundo o pesquisador, quando se fala da diversidade da fauna e da flora da região amazônica, também se fala em multiplicidade de padrões.
Enquanto as abelhas nativas da região são as sem-ferrão, o mel mais acessível ao consumidor costuma ser produzido por uma abelha com ferrão proveniente da Europa e com larga introdução em diferentes ecossistemas.
“Essas abelhas sem-ferrão produzem um mel que só tem praticamente aqui na região Norte. Ele tem uma umidade mais alta, portanto é mais fluido. Também tem uma acidez maior como característica típica”, informa Muto.
“Alguns acham que por estar fora dos padrões ele não deveria ser comercializado, mas nós pensamos o contrário. Por ser de natureza distinta, ele tem qualidades diferentes, possibilitando outras formas de uso. Esse mel mais ácido, por exemplo, ficaria uma delícia com um peixinho”, avalia o pesquisador.
Mais abelhas, mais açaí
Quando se fala em açaí, especialmente, em culturas irrigadas, as abelhas sem ferrão podem exercer um papel central na plantação. Um estudo
publicado por Nilton Muto, no volume 15 da Revista Verde (2020), aponta um aumento significativo na produtividade, chegando a 2,5 vezes mais, dependendo da distância entre a planta e as colônias de abelhas.
“A polinização dessa abelha nativa aumentou de 30 a 70% a produção do açaizal observado. Então, por exemplo, se você tem uma tonelada por 100 m² na produção, nesse mesmo espaço, ao inserir enxames fortes de abelha de determinada espécie, você consegue jogar pra uma tonelada e 700 kg, sem ter que comprar mais terra”, conta Muto.
O estudo também observou o aumento da qualidade dos frutos. “As palmeiras mais próximas das colmeias registraram cachos com frutos mais robustos e em maior quantidade. Também ocorreram menos abortamentos, ou seja, menos queda desses frutos. O objetivo agora é expandir a pesquisa, estamos articulando a inserção dessas abelhas no Sistema Agroflorestal de Tomé Açú (SAFTA)”, revela o pesquisador.
Panorama produtivo
As regiões de integração do Rio Capim e dos Caetés são as principais produtoras de mel no Pará. O levantamento do Núcleo de Planejamento e Estatística (Nuplan) da Secretaria de Desenvolvimento Agropecuário e da Pesca (Sedap) mostra que os municípios de Capitão Poço, Tracuateua, Bragança e Ourém são os maiores produtores de mel do estado.
Os dados mostram, também, que até o ano passado (ano de referência do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas – IBGE) o Pará produziu 670.284 quilos de mel, aparecendo em 12º lugar no cenário nacional.
A diretora de agropecuária da Sedap, Brenda Caldas, disse que o estado ainda tem uma produção abaixo do esperado, comparado com o cenário nacional, contribuindo com 1,46% da produção. Ela explicou que no Brasil, o estado que lidera o ranking é o Paraná, com 15,72% da produção de todo o território nacional.
“A Sedap trabalha para aumentar essa produção, que já cresceu se compararmos, por exemplo, com dois anos atrás. Foram produzidos cerca de 110 quilos de mel de abelha a mais”, frisou Caldas.
“A tendência até o final do ano é de crescimento; a gente vem fazendo um trabalho junto aos produtores locais, não só para que a curva de produção continue ascendendo como para melhorar cada vez a qualidade do que é produzido”, complementa Brenda Caldas.